quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Alimentos versus Combustíveis A Batalha do século XXI

Por Denis Rodrigues de Oliveira
4º Ano Gestão Ambiental
ESALQ / USP

Alarmantes notícias e artigos sobre a segurança alimentar no futuro são comuns em revistas, jornais e sites especializados, ou não, em agricultura. O site da FAO ilustra bem essa situação. Não poucos são os artigos que tratam do assunto, sendo que um em especial chama a atenção, principalmente pelo título: 2050: UN TERCIO MÁS DE BOCAS QUE ALIMENTAR. A matéria de 23/09/2009 apresenta interessantes informações e dados que invariavelmente nos levam a uma indagação: Vamos conseguir alcançar tal feito? Como não bastasse a dramaticidade do assunto, adicione ao roteiro a busca por alternativas energéticas aos combustíveis fósseis, que vai de encontro com a produção de alimentos, pois a primeira opção da maioria dos países para essa substituição da matriz também está no campo.
Chegamos então em um momento decisivo no qual temos um desafio muito grande à nossa frente: Temos de produzir 70% a mais de alimentos para 2,3 bilhões de pessoas (a mais) em pouco mais de 40 anos e ainda abastecer os tanques sedentos dos automóveis, que transportarão bilhões de pessoas ao redor do mundo todo em um futuro breve.
Segundo o artigo supracitado, apesar dos números alarmantes, a FAO está otimista, embora cautelosa, quanto a capacidade do mundo em se alimentar. Os especialistas da organização acreditam que a produtividade será capaz de resolver o problema da quantidade de alimentos necessária para o abastecimento da população global. Além disso, acredita-se que a expansão das fronteiras agrícolas, principalmente nos países em desenvolvimento, será suficiente para atender a demanda por alimentos, mesmo considerando as limitações dos recursos naturais.
Quanto a esses, os números também são desnorteantes; em relação ao uso da água as preocupações existem, contudo espera-se um crescimento lento do consumo deste recurso por causa da otimização do seu uso, através do aumento da eficiência da produção agrícola. Mesmo assim espera-se um incremento de 11% no consumo de água para 2050. A maior preocupação está na má distribuição deste recurso pelo globo, colocando os países do Oriente Médio, Norte da África e Sul da Ásia em situação complicada.
Acredita-se que 90% do crescimento da produção necessária para o abastecimento global venham através da melhoria da produtividade e intensificação das culturas, mesmo assim espera-se um aumento de cerca de 120 milhões de hectares de terras agricultáveis nos países em desenvolvimento, principalmente na região da África Subsariana e América Latina; Enquanto espera-se que diminuam em 50 milhões de hectares as terras agrícolas nos países desenvolvidos, desde que (essa condição apresenta uma importância fundamental), a demanda por biocombustíveis não interfira nesses cálculos. Do ponto de vista global, ainda existe quantidade segura de terras para alimentar a população, porém a FAO se preocupa e alerta para o problema da concentração destes espaços em poucos países, e para prática de grandes culturas que não necessariamente atendam à demanda por alimentos da população.
Além disso, é preciso considerar que parte destas terras disponíveis para a expansão agrícola ou são florestas ou estão à mercê da expansão da área urbana, isso nos leva à incorporação de mais variáveis à nossa problemática: a questão ambiental e o aumento da demanda por energia, empregos e alimentos, conseqüência da urbanização. Desse modo, as questões ambientais e sociais se juntam aos fatores técnicos para a resolução do problema de alimentos, sem esquecer que vivemos em um sistema de produção no qual a economia de mercado dita as regras, se fazendo necessária a viabilidade econômica das ações para que estas sejam colocadas em prática. Dentro deste amplo panorama, podemos perceber, assim como fez o Diretor Assistente da FAO Hafez Ghanem, que apenas as capacidades técnicas não são capazes de resolver o problema da fome no mundo. Segundo o mesmo, é preciso haver investimentos em infra-estrutura socioeconômica para que as pessoas tenham acesso à alimentação e essa infra-estrutura não pode desconsiderar que os recursos naturais são limitados e que a preservação do meio natural é imprescindível para a manutenção da qualidade de vida das pessoas seja no presente ou no futuro.
O embate que intitula o presente trabalho é motivo de preocupação crescente entre especialistas, governantes e organizações civis interessadas na segurança alimentar do planeta. A análise das conseqüências do rápido crescimento da demanda por biocombustíveis, principalmente os líquidos, demonstra que a segurança alimentar do mundo se encontra ameaçada, já que a demanda por produtos agrícolas para a produção de combustíveis pode entrar em competição com a produção de alimentos.
É preciso compreender, entretanto, que o aumento da demanda por biocombustíveis é impulsionado, em sua grande maioria, por políticas governamentais de países desenvolvidos que, viram na produção de combustíveis tidos como limpos a melhor alternativa para a mitigação dos impactos ambientais negativos causados pelo uso de combustíveis fósseis, para o estabelecimento de segurança energética e desenvolvimento agrícola. O efeito colateral direto é a competição entre alimentos e biocombustíveis. Outros aspectos negativos estão sendo levantados acerca desse assunto, como o real impacto ambiental causado pelos biocombustíveis e o acelerado avanço do conhecimento científico no que tange os impactos, repercussões e conseqüências socioeconômicas e ambientais da crescente demanda por essa alternativa energética. A nossa compreensão sobre estas variáveis é importante para a tomada de decisões e formulação de políticas públicas que regulamentem todo o processo, desde a produção no campo aos supermercados e bombas de postos de combustíveis.
O Estado de Agricultura e Alimentação 2008, publicado pela FAO aponta as seguintes diretrizes gerais para a formulação de políticas adequadas à problemática aqui abordada:
Proteger a população que se encontra em condições de pobreza contra a insegurança alimentar;
Aproveitar as oportunidades para o desenvolvimento agrícola e rural;
Assegurar a sustentabilidade ambiental;
Revisar as políticas de biocombustíveis existentes;
Fazer com que o sistema internacional seja favorável ao desenvolvimento de biocombustíveis.
Como se pode esperar, a batalha travada entre a alimentação das bocas humanas e os tanques dos automóveis não deixou o Brasil de fora. Em terras tupiniquins o embate tem na cana de açúcar o seu maior representante. Considerado, segundo José Graziano da Silva, o zebu brasileiro, a cana de açúcar vai bem em qualquer lugar e não respeita cercas divisórias de propriedades. Contra o nosso novo ouro verde, associam-se também especulações sobre sua invasão à Floresta Amazônica, além da competição pelas áreas agricultáveis com os alimentos.
No meio desta guerra que ganha adeptos de afoitos investidores e produtores de um lado e protecionistas sociais e ambientais de outro, o governo brasileiro vem tomando “...Medidas que levantam cercas e criam salvaguardas ambientais e sociais”. (José Graziano da Silva). Essas medidas traçam o zoneamento agroecológico da cana de açúcar no Brasil, impedem a instalação de novas usinas ou plantações de cana em áreas de vegetação nativa, não importando o tipo de vegetação, protegendo assim desde a Amazônia ao Cerrado ou Mata Atlântica. As restrições também avançam para o sistema de créditos agrícolas, fazendo com que estes funcionem como travas capazes de impedir o avanço da agroenergia em áreas ocupadas pela produção de alimentos.
“Somado às restrições de unidades de conservação já existentes e territórios indígenas demarcados, a cana de açúcar fica vetada em mais de 80% da área total do país, ainda assim preservando um amplo horizonte de expansão, já que a lavoura destinada ao etanol ocupa menos de 1% da área agricultável do país.” (José Graziano da Silva)
O governo brasileiro se posiciona de acordo com as diretrizes apontadas pela FAO. Contudo se as medidas serão suficientes para amenizar as tensões ocasionadas pelas variáveis aqui apresentadas já é outra história. Correntes aliadas e contrárias ao posicionamento da FAO irão se formar, e outras idéias deverão surgir, e assim se espera que como a maioria das grandes histórias sobre épicas batalhas, esta também tenha um final feliz.








Links consultados:

https://www.fao.org.br/vernoticias.asp?id_noticia=867
https://www.fao.org.br/2050atmmtf.asp

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