sábado, 17 de abril de 2010

UTOPIA



Por Alberto Kirilauskas

Hoje, vendo o mundo do jeito que está, as relações entre as pessoas do jeito que estão, sinto que há algo errado. Não posso, por minha convicção de que a certeza deve
estar subordinada a dúvida, afirmar quais são os motivos geradores dessa coisa que sinto. Coisa esta que às vezes me tira o som da palavra e me faz expressar um olhar. Mesmo sem afirmar os motivos desse “estar errado” que sinto, insiro no debate o que parece não ser mais debatível: as possibilidades de mudanças. As nossas crenças parecem não ser mais crenças que se mantém sustentadas por uma voz profunda que nos orienta, mas sim crenças que estando em pé ou tombadas após o combate, são apenas idéias num plano que está desconexo da realidade. Algo se perdeu de nós enquanto respirávamos ar poluído, se perdeu sob esse pó denso que deixa nossa voz pesada quando não há necessidade.
Vivemos num mundo em que ser e estar se apresentam como se fossem a mesma coisa. Não apenas perdemos a esperança no presente, mas sim também no futuro, os assassinamos silenciosamente, os tiramos a vida por não estarmos vivos. Transformamos nosso passado num único plano, aquele que, mesmo com o passar dos anos, se mantém constante. É esse argumento de que as coisas sempre foram assim: impossíveis de mudar, que torna os dias lineares. Esse hábito se instalou como se fosse verdade, se apropriou da nossa capacidade de refletir e questionar e nos propôs a atividade de retransmitir o que observamos, e aceitamos a condição que foi apresentada: as coisas são impossíveis de mudar. Agora, nesse mundo que me parece estar seguindo para a escalada errada, temos os minutos como se fossem horas, horas como se fossem meses, anos e décadas, o segundo já não é mais o instante que existe em forma única, construído num único espaço, na probabilidade que ocorreu, mas sim ele é apresentado como a menor parte de uma outra unidade de tempo, que é a parte menor de outra, e assim segue. Temos as ruas como se fossem bairros, bairros como se fossem cidades, países e continentes, construídos num único momento, a ruela já não é mais o espaço onde se constrói o caminhar do aprendizado único. Não digo que o tempo e o espaço são coisas diferentes, mas sim que eles estão como se fossem mera unidade de medida. Nesse mesmo tempo e espaço em que tantos apenas utilizam para mensurar os interesses particulares, está correndo vida em seu estado puro. Os pulmões inflam, o coração bate, uma emoção se aflora, o olho pisca, a mão se move, toda essa vida está agora, nesse tempo em que me encontro, nesse espaço em que estou, fluindo numa dança oscilante, com um compasso que só é possível compreender quando pudermos observar a ligação que existe entre tudo e todos. Vivemos... e a vida é constituída de infinitas particularidades, e a soma de cada uma resulta numa resposta diferente, então é assim que desconfio que o mundo funciona, com cada tempo, emoção, movimento da vida expelindo uma resposta diferente, tornando o mundo diferentemente em cada espaço e tempo, assim, eu vos digo com o braço descansando sobre a mesa, os olhos
na tela, a música aos ouvidos, as pernas cruzadas, um pé descansando sobre o outro, o
pulmão inflando, o coração batendo, o sangue circulando, que tudo está mudando... tudo é possível de mudar!

“As utopias não existem para serem realizadas de maneira a escravizar mas para porem em debate as possibilidades das coisas almejadas e difíceis e para revigorarem nossa crença de que elas são possíveis.”

Hermann Hesse

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