quarta-feira, 2 de novembro de 2011

O RAP e o mundo

Por Alberto Kirilauskas

                O RAP é uma manifestação cultural cuja a sigla significa Ritmo e Poesia em inglês. O ritmo é marcado por batidas com seus compassos e tons e a poesia muitas vezes conta a realidade do local onde vivem as pessoas que escrevem as letras. Essa manifestação cultual ocorre comumente nas regiões periféricas das grandes cidades[1], mas não somente, há RAP’s sendo feitos em regiões que não estão inseridas em grandes centros.
                A batida é geralmente forte e bem marcada, onde muitos RAP’s inseriram no seu ritmo instrumentos eruditos como violino, piano, cello e outros, fazendo assim uma mistura que agrega à música. Essa marcação é que orienta os dizeres da poesia. A poesia além de contar a realidade do local sob a ótica dos que vivem dentro dela, também possui diversos elementos que são reflexões que extrapolam o local para ganhar dimensões maiores.
Compartilho o clip do SNJ - Pensamentos
                Trago aqui alguns trechos de RAP’s que considero bons e interessantes.
Falar sobre um conjunto tão grande geralmente ocorre de se negligenciar algo, porém aqui não objetivo falar sobre a história do RAP e sobre suas características musicais com seus compassos e tons, o objetivo central aqui é analisar algumas músicas.
                Numa sociedade tão ligada à imagem, ainda mais quando se trata de bebidas alcoólicas, SNJ na música Viajando na Balada diz:
“A imagem não é nada
vê se não se ilude
enquanto sobem com cachaça
eu subo com iacuti
                Vale aqui lembrar que essa música é do início da década passada, onde a homogenização da felicidade associada à bebida alcoólica não era tão intensa como atualmente. Não entrarei nesse mérito, pois ele é amplo e merece uma discussão com mais elementos.  Através desse pequeno trecho poderíamos entrar num diálogo sobre esses pontos levantados: imagem e bebida alcoólica.
                Um dos aspectos apresentados por muitos que criticam RAP é o conteúdo violento de suas letras. Aqui eu apresento dois trechos que dizem o contrário do que se pensa. O primeiro é o Racionais e o segundo do MV Bill.
“Falo do amor entre homem, filho e mulher
A única verdade universal que mantém a fé.” (Racionais – A vida é desafio)

“Eu faço apologia não do crime,
sim da paz.
Mas roupa branca sem pensar na maioria
pedir paz sem justiça é utopia.” (MV Bill – Só mais um maluco)

                Mesmo existindo a violência no cotidiano de muitas pessoas, ele é rejeitado em muitas letras. E ainda com essas críticas a violência ocorre mesmo entre os que escrevem as poesias. Essa fato não é tão difícil de caracterizá-lo, pois a construção da violência é um processo complexo que envolve educação, desigualdades sociais, questão psicológicas e outros fatores. E quando essa violência ocorre, desagrada aqueles que a criticam. Por exemplo, num áudio de um show do Racionais o Brown, um dos vocalistas,  parou o show porque estava ocorrendo uma briga na platéia e discursou sobre a desnecessidade de agir daquela forma. Aqui também apresento um trecho da música O Mensageiro do RZO que traz essa crítica à violência que ocorre entre esses artistas.
“vejo nos bailes RAP umas milhares de pessoas
não conquistamos o respeito ai, mas nem com festas boas
no meio do salão um tiroteio desacerto
um mano correndo com uma mina no colo eu já conheço é daquele jeito
e o movimento, que é o escudo dos pretos
atitude nesses trechos é ferrugem corroendo
me sinto magoado no estado de chato
isso pra mim tá claro de fato
o que eu fiz lutei foi fraco
os mano erraram entenderam o contrario” RZO – O Mensageiro
Para mim é claro a inserção do “tema” violência em muitos RAP’s, onde para compreender o motivo é necessário fazer uma análise crítica da sociedade brasileira, com suas mazelas e desigualdades. Todavia, como apresentado nalguns trechos acima, ela em muitas vezes é rejeitada.
Aqui, neste curto diálogo com o RAP, busquei desmistificar alguns aspectos que permeiam essa expressão cultural, porém esse não foi o objetivo central. O que me parece ser de grande relevância e merece um cuidado especial quando pensarmos nessas músicas é que essa é uma descrição da realidade, é o mundo vivido por muitos que está retratado nas poesias, e é o mundo não visto de fora, mas sim de dentro, e é aí que acredito ser a grande expressão dessa arte, e para muitos de nós que conhecemos tão pouco a realidade do país, das nossas cidades, ouvir RAP é uma forma de estar um pouco mais próximo das pessoas que também vivem nos grandes centros, pois, por exemplo, São Paulo não é somente a Av. Paulista e sua arquitetura e expressão artística da região central, ela é maior, é contraditória e viva nos bairros mais afastados dos olhos do que estão de passagem. Logicamente que há quem não gosta do estilo da música, e isso deve ser respeitado sempre, pois a diversidade deve ser preservada, porém como disse anteriormente, acredito que é possível, através de RAP (e outras expressões artísticas) estar menos distante, então, RAP não é só uma questão de gosto musical, também é uma vontade de enxergar um pouco melhor o mundo como ele é.  
Aqui também acredito caber uma crítica à apropriação desse estilo musical pelo mercado. Tal apropriação que ocorre (ao meu ver, raras vezes, pois esse não é o estilo que aceitado por grande parte dos brasileiros) acaba por descaracterizar a expressão, ela ganha formas de um mundo que parece não ser aquele que vive os poetas do RAP.
Já em linhas finais, compartilho um trecho da música dos Racionais que diz:
“Onde estiver, seja lá como for
tenha fé porque até no lixão nasce flor.” Racionais Vida Loka Part I
É com essa esperança que existe mesmo num mundo denso que encerro.


[1] Aqui cabe destacar que é necessário analisar com cuidado o que é denominado centro-periferia no mundo globalizado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário