domingo, 16 de outubro de 2011

Dialogando com os atuais desafios socioambientais das civilizações históricas

Por Rachel Trovarelli



Atualmente existe um grande esforço de um grupo de pessoas no mundo para chamar a atenção da população mundial - e em especial dos políticos - para as questões socioambientais. Este grupo é formado por cientistas, estudantes, profissionais da área socioambiental, militantes políticos, ambientalistas, entre outros preocupados com o futuro dos recursos ambientais e naturais do nosso meio. Preocupação esta que nos possibilita discutir e questionar nosso futuro enquanto espécie animal do planeta Terra.

Os indicadores de que nossa sociedade global não está em equilíbrio com o ambiente são incontáveis: o não acesso a recursos básicos de sobrevivência como a água tratada, destinação correta de esgoto, habitações precárias e baixa disponibilidade de alimentos para todos. O aumento de doenças oriundas de vetores com habitats destruídos, a poluição aquática, terrestre e atmosférica, as mudanças climáticas, a destruição de solos, a perda de biodiversidade e de ecossistemas raros no mundo, são alguns sintomas de que algo está errado.

Se pensarmos ainda nos índices de qualidade de vida como escolaridade, lazer, felicidade e contrastarmos com os índices de pessoas estressadas, agressivas, depressivas e suicidas, teremos a certeza de que somos uma sociedade desequilibrada emocionalmente, ambientalmente, socialmente e economicamente.

Fatores como a destruição ou perda de hábitats naturais, fontes de alimentos selvagens, diversidade biológica e solos já causaram extinção de diversas sociedades na história recente da humanidade.

Os pascoenses, habitantes da Ilha de Páscoa, tiveram uma séria crise socioambiental que acabou praticamente extinguindo a população. A Ilha de Páscoa possuía uma imensa vegetação, bem como uma fauna muito diversa. A sociedade era organizada em clãs. Os chefes competiam na insistência erguer estátuas (Moais) voltadas ao mar, cada vez maiores, acreditando na salvação própria. Essas estátuas possuíam uma demanda imensa de recursos energéticos humanos e ambientais (madeireiros). Destruindo os solos agricultáveis, a floresta, desequilibrando o ecossistema resultando na exaustão dos animais marinhos e aves aquáticas, os pascoenses guerrearam entre os clãs por alimentos e recursos, inclusive com evidencias de canibalismo.

Já os Maias, civilização que habitou a Guatemala, Honduras e o sul do México, guerreavam em nome dos Deuses. Tratava-se de uma luta de poder entre as cidades-estados. A sociedade Maia era avançadíssima em técnicas de engenharia, sistemas matemáticos e contagem do tempo. O colapso desse povo veio juntamente com o aumento populacional e a falta de alimentos, o solo calcário propício a erosões, a falta de água na região e o desmatamento para as grandes construções.

Os vikings, povo originalmente escandinavo e de cultura sangrenta, vivia como piratas em gangues saqueadoras. Os imensos e resistentes barcos eram a principal característica do povo viking. Para construí-los houve um intenso desmatamento e alteração da paisagem escandinava. Possuíam uma rede comercial em toda a Europa e eram treinados para as guerras e dominações. Este povo viveu em diversas colônias: na Vinlandia (atual Canadá), na Groelândia, na Noruega e nas ilhas do Norte e em cada habitat tiveram dificuldades de sobrevivência diferentes, entre elas: desmatamento, falta de alimentos, clima inóspito e resistência a alterações de padrões de vida que levavam na Europa.

Hoje, temos uma sociedade mundial, com algumas diferenças culturais regionais, porém todas muito próximas devido a globalização. Marjoritariamente o sistema econômico dita as regras de sobrevivência em um planeta em que nas últimas décadas tem sofrido um intenso aumento populacional. Dessa forma, desastres ambientais e sociais em uma comunidade geralmente afetam direta ou indiretamente o resto do mundo.

A disponibilidade de alimentos está intimamente ligada às técnicas de produção e ao crescimento populacional. Tanto os maias quanto os pascoenses sofreram nesse sentido, sendo essa uma das causas do colapso dessas civilizações. Nada muito diferente do que temos hoje em nossa sociedade contemporânea, globalizada, moderna, tecnológica...

O Brasil tem recentemente discutido sobre a política pública que legitima espaços de preservação ambiental, principalmente relacionada a agropecuária: O Código Florestal Brasileiro. O quadro do país se assemelha com o das civilizações históricas: intenso aumento da população, práticas agrícolas para a produção de alimentos e destruição do ambiente natural.

O que intensifica ainda mais os danos no Brasil, é o fato que muito da produção a agrícola é para a exportação. A soja cultivada no centro oeste do país é matéria prima para a ração animal produzida na Europa. A cana de açúcar do sudeste e parte do nordeste é a matéria prima principal para a produção de biocombustíveis. A pecuária no sul e centro oeste é para exportação também. Como conseqüência, temos a alto preço de produtos alimentícios e a crescente taxa de inflação.

Dessa forma, o país cresce economicamente abastecendo o mercado globalizado. Porém, internamente, a fome e a escassez de recursos e políticas públicas que protejam os recursos naturais e povo brasileiro deixam muito a desejar.

Podemos ainda citar, no caso brasileiro, a exploração insustentável (e muitas vezes ilegal) de recursos ambientais na floresta Amazônica e na Mata Atlântica como o palmito Jussara, recursos madeireiros acompanhado de intensos desmatamentos e tráfico de animais silvestres como fatores que podem levar ao colapso deste ecossistema e dos recursos citados.

A exploração do petróleo que já está com os dias contados, as crescentes disputas por água potável, entre outros, são exemplos de recursos que utilizamos hoje e que em breve sofreremos com a pouca disponibilidade.

Para mitigar esses problemas socioambientais citados, a ação governamental é indispensável. A fiscalização e monitoramento das áreas de risco é urgente. A alternativa social, criação de empregos para a comunidade local, capacitação de utilização de técnicas sustentáveis de exploração de recursos florestais, entre outros, são medidas que contribuiriam no controle dessa situação. Mas, essas ações devem ser acompanhada de uma política pública estadual e nacional viável e direta no combate a destruição de hábitats naturais. Soluções locais e criativas devem ser valorizadas.

Diante de todo esse contexto apresentado, podemos interpretar cada narrativa, ação e modo de visualizar os problemas enfrentados pelas civilizações históricas e contemporâneas. Joshua Meyrowitz, defende que podemos analisar as tecnologias materiais e simbólicas partindo de três narrativas. São elas:

a) Narrativa de poder;

b) Narrativa da busca pelo prazer e autorealização;

c) Narrativa dos padrões criados pelas mídias através dos quais elas próprias influenciam a sociedade.

Por exemplo: na cultura pascoenses, os clãs construíam grandes moais. Quanto maior a estátua mais poder e prazer tinha aquele rei ou clã (narrativa dos poderes e dos prazeres).

Outro exemplo é o povo viking na Groelândia: o povo estava sofrendo com o clima inóspito e a falta de alimento, porém não queriam abdicar da cultura tradicional européia (narrativa de padrões). Apesar de terem muito proximamente o povo inuit os vikings se consideravam povos superiores (narrativa de poder) não aceitando o intercambio de informações e produtos.

A narrativa de prazer e de padrões, estão intimamente ligadas a narrativa de poder. É necessário poder para a manutenção dos padrões e dos prazeres.

Independente da narrativa utilizada, o que concluímos é que as civilizações históricas muito sofreram com o desequilíbrio ambiental que se estendeu ao desequilíbrio social culminando no colapso civilizatório. As ações desses grupos infelizmente são muito parecidas com as explorações ainda feitas até hoje no mundo globalizado. Essas ações são sempre pautados pelo poder, prazer ou manutenção de padrões.

Resta decidir se iremos aprender com os povos históricos ou se seguiremos o mesmo caminho por eles trilhado...



Referencias utilizadas:



DIAMOND. Jared. Colapso. Como as sociedades escolhem o fracasso ou o sucesso. Rio de Janeiro: Record, 2005.

MEYROWITZ. Joshua. Power, Pleasure, Patterns: Intersecting Narratives of Media Influence. Journal of Communication, 58:641-63, 2008.

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